sábado, 14 de fevereiro de 2015

Koto


O koto é um instrumento musical tradicional japonês de cordas dedilhadas. É actualmente o mais popular dos instrumentos tradicionais japoneses sendo, inclusive, considerado o instrumento tradicional nacional do Japão.
Trata-se de um cordofone da família das harpas, muito semelhante à cítara, constituído por um corpo com cerca de 180 centímetros formado por duas pranchas de kiri (madeira extraída de árvores originárias da China e Japão do género Pawlownia) laqueadas, que funcionam como caixa de ressonância, e por 13 cordas de seda ou nylon presas a duas pontes fixas localizadas nas extremidades. A afinação das cordas é efectuada através do posicionamento de 13 trastes moveis (um por cada corda) que podem ser movidos mesmo durante a execução de uma música.



Koto tradicional de 13 cordas



Actualmente é um instrumento maioritariamente tocado por mulheres sendo o seu ensino nas escolas do Japão tão popular como o do piano ou do violino.


Mulher vestida com um kimono tradicional tocando koto



Escola de koto de Yokohama cujo programa abrange o 1º,2º e 3º ciclos incluindo o ensino superior.


Existem algumas variações deste instrumento, como os kotos de 17 cordas, de 21 cordas e até de 80 cordas. Estes modelos foram desenvolvidos para orquestras de koto de forma a poderem produzir uma maior gama de notas na escala harmónica, muito particularmente nos sons mais graves.


Orquestra de koto que inclui kotos de 13, 16, 21 e 80 cordas.


Descobri este instrumento por volta do início da década de 90 quando requisitei um CD da biblioteca municipal de Vila Franca de Xira - "Koto Music.: Tadao Sawai plays Michio Miyagi", sem fazer a mínima ideia do que se tratava. Foi nessa altura que comecei a interessar-me por World Music e tinha o hábito de procurar ouvir a música tradicional, mas nova para mim, oriunda dos vários cantos do mundo. Este interesse acabaria por se transformar numa paixão que me acompanhou até hoje.
Na altura fiquei viciado no CD e no som muito peculiar do koto, o qual, a meu ver, faz parte da identidade cultural do Japão, que, confesso, não conheço em profundidade. De facto, basta-nos ouvir uma corda deste instrumento vibrar para sermos catapultados imediatamente para o Japão medieval e para o universo mítico dos samurais, dos shoguns, dos senhores da guerra e das gueixas.




O meu interesse no CD não se resumia à música pois na altura era, e ainda sou, um grandessíssimo admirador de cinema Japonês, nomeadamente de realizadores que ao longo da sua obra se debruçaram muito sobre o Japão feudal, como Akira Kurosawa, do qual posso destacar títulos incontornáveis do cinema universal como Rashõmon, às portas do inferno (1950), Os sete samurais (1954), Trono de sangue (1957), Kagemusha, a sombra do guerreiro (1980) e Ran, os senhores da  guerra (1985); e Kenji Mizogushi com o seu magnífico Contos da lua vaga (1953).
Penso que a maioria destes filmes, pelo menos os mais antigos, vi-os pela primeira vez nos saudosas ciclos de cinema da RTP 2 - "Cinco noites, cinco filmes".


Cena do filme Rashõmon, às portas do inferno (1950) de Akira Kurosawa. Na fotografia podemos ver Toshiro Mifune (a esquerda) e Machiko Kyō (à direita).



Cena do filme Ran, os senhores da guerra (1985) de Akira Kurosawa. Na fotografia podemos ver o inesquecível Tatsuya Nakadai (à direita) no papel de o senhor da guerra Hidetora Ichimonji e Shinosuke Ikehata (à esquerda) no papel de Ryoami (o bobo).


Cena do filme Contos da lua vaga (1953) de Kenji Mizogushi. Na fotografia podemos ver Masayuki Mori (à esquerda) no papel de Genjurô e Machiko Kyô (à direita) no papel de dama Wakasa.


Estes filmes têm uma banda sonora magistral e recordo-me em particular de uma das cenas finais de Ran, os senhores da guerra, que não encontrei no Youtube, em que um cego, mutilado, e último descendente de uma família que foi anteriormente muito poderosa, e que acabou completamente destruída por Hidetora, fica sozinho e esquecido à beira de um penhasco, nas ruínas do, outrora imponente, castelo da sua família, tendo deixado cair no precipício a sua preciosa flauta, que era a única companhia e único prazer que ainda lhe restava na vida. O som de uma flauta tradicional japonesa acompanha toda a cena ajudando a reforçar o ambiente dramático e desolador. Apesar de não me lembrar de ouvir koto nas bandas sonoras destes filmes, o gosto que desenvolvi, ao vê-los, pela sonoridade e ambiência da música de raiz tradicional japonesa contribuiu em muito para a minha curiosidade pelo koto. Deixo aqui o link para um vídeo do youtube referente à banda sonora de Ran, os senhores da guerra, da autoria de Tōru Takemitsu.




A origem do koto japonês remonta aos séculos VII e VIII, período em que o guzheng (um instrumento chinês muito semelhante e mais antigo) foi introduzido no Japão a partir da China.
Nessa altura, o instrumento tinha apenas 5 cordas e era desprovido de trastes moveis, mas, posteriormente, foi sofrendo, ao longo do tempo, desenvolvimentos que culminaram na configuração actual.

O koto está presente amiúde na arte e literatura japonesa desde a antiguidade, podendo-se destacar as pinturas em blocos de madeira representando mulheres tocando koto, e o grande clássico da literatura japonesa e universal, "O romance de Genji", escrito no início do século XI e atribuído a Murasaki Shikibu .




Jovem mulher segurando um koto. Pintura em madeira de 1800 da autoria de Katsushika Hokusai.



Mulher tocando koto. Pintura de 1878 de Hasegawa Settei.


Mulheres tocando koto. pintura em madeira de 1896 pertencente à série Chiyoda No Ooku.


Por sorte, consegui comprar, há uns 4 ou 5 anos, os dois volumes de "O romance de Genji" editados pela Exodus na feira do livro de Lisboa, a menos de metade do preço. Não sei se é a melhor edição, no que à tradução diz respeito, mas, pelo menos é uma edição com capa dura, com boa qualidade gráfica e o preço foi bastante em conta.




Tive imensa sorte com o primeiro CD que ouvi de koto pois Michio Miyagi (1894-1956) e o seu pupilo mais famoso, Tadao Sawai (1937-1997), são dois nomes incontornáveis da música produzida para e por este instrumento. 


Michio Miyagi foi o grande mestre de koto, sendo-lhe atribuído o epíteto de grande revolucionador da composição de música para este instrumento, e tendo inclusive desenvolvido várias versões do mesmo. Estará talvez para o koto como o Astor Piazzolla está para o acordeão e para o tango, e como o Carlos Paredes está para a guitarra portuguesa. O facto de ter perdido completamente a visão aos 8 anos ainda lhe confere uma maior aura de genialidade.


Michio Miyagi (1894-1946) tocando koto.


Outro grande mestre de koto foi Tadao Sawai, que é, talvez, o maior expoente da moderna música de raiz tradicional composta para este instrumento, tanto enquanto compositor como enquanto intérprete.


Tadao Sawai (1938-1997) tocando koto.


Deixo aqui alguns dos exemplos mais interessantes e representativos que encontrei de música de raiz tradicional japonesa em que o koto tem um papel central.

No vídeo seguinte, Sachiko Yoshihara, envergando um kimono tradicional japonês, interpreta "Sanka", uma ode à natureza, às pessoas e às artes, composta por Tadao Sawai em 1978.




No vídeo seguinte, Endo Chiaki interpreta "Gaku", uma música composta também por Tadao Sawai.





No vídeo seguinte, uma orquestra de koto interpreta "Homura", uma peça com uma sonoridade mais contemporânea composta por Tadao Sawai.




Os 2 vídeos seguintes referem-se a músicas que fazem parte do primeiro CD que ouvi de koto. ambas foram compostas por Michio Miyagi e interpretadas por Tadao Sawai.
O vídeo seguinte é "Rinzetsu (Tegoto - 3º movimento)", música composta por Michio Miyagi em 1946 e interpretada por Tadao Sawai, cuja fotografia aparece no vídeo.




O vídeo seguinte é "Onoe no Matsu", música composta por Michio Miyagi em 1919 e interpretada por Kazue Sawai (koto) e Tadao Sawai (shamisen e voz). Shamisen é um cordofone tradicional japonês parecido com o banjo.





No vídeo seguinte podemos ouvir mais uma composição de Michio Miyagi (1919), Aki no shirabe (som de outono) interpretada por Rié Yanagisawa (koto, shamisen e voz) e Clive Bell (shakuhachi). Shakuhachi é uma flauta de bambu tradicional japonesa.





Interpretada também por Rié Yanagisawa (koto, shamisen e voz) e Clive Bell (shakuhachi) podemos ouvir uma das mais antigas composições conhecidas para koto, que remonta ao século XVIII, de autor desconhecido - Kurokami (cabelo preto).





Talvez a mais famosa intérprete de koto viva seja Kazue Sawai, que foi também aluna de Michio Miyagi e casou com Tadao Sawai. Ela tem-se destacado principalmente no âmbito da música erudita contemporânea e em improvisação livre, tendo colaborado por exemplo com John Cage. No vídeo seguinte podemos vê-la a tocar um jushichigen (koto com 17 cordas com um som mais grave conhecido também como bass koto).





Outra das tendências actuais da música composta para orquestra de koto traduz-se numa notória aproximação à sonoridade ocidental, designadamente, à música erudita clássica e contemporânea e até ao pop/rock.

Nos dois vídeos seguintes pode-se ver  Soemon, um ensemble de koto, interpretando em concerto "Esoragoto" e "Yume no Wa", composições de mais um membro do clã Saway, Hikaru Sawai, que é filho de Tadao e Kazue Sawai.







Ainda o grupo Soemon interpretando, em concerto, "Ichimen Moegiro", uma composiçãpo de Hiroshi Yoshimura.



Gosto pouco destas abordagens quase pop da música para koto mas decidi colocar aqui os vídeos anteriores porque são bastante representativos desta nova tendência.

Neste vídeo o New Koto Ensemble of Tokyo interpreta magistralmente o "Concerto de Inverno" de Vivaldi. Neste trabalho podemos ver como o koto se adapta bem à música erudita clássica.




O site The International Shakuhachi Society disponibiliza, de forma muito organizada, um grande volume de música tradicional japonesa e, apesar de se centrar principalmente na flauta tradicional de bambu japonesa (Shakuhachi), tem uma considerável colecção de música composta para ou tocada por koto. Tem também muita informação sobre os principais compositores e interpretes de koto, incluindo listas de obras, edições discográficas, cronologias, biografias, etc.

1 comentário:

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